Curu-Paraipaba luta para manter viva a produção de coco

Paraipaba. Há 40 anos, o agricultor Antônio Vitor de Sousa resolveu investir em um lote de terras no Perímetro Irrigado Curu-Paraipaba (Vales do Curu e Aracatiaçu), às margens da CE-085, no município de Paraipaba, a 90Km de Fortaleza. A megaestrutura, de 12.347 hectares, foi implantada pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) em 1975. Hoje, o órgão apenas fiscaliza as atividades. Da área total, 3.220 hectares são irrigáveis, e o agricultor, que vive exclusivamente do que a terra produz, tem no plantio de coco importante meio de subsistência, nos últimos cinco anos, ameaçado pela falta de chuva. Após seguidas perdas da produção, mais uma vez teve de pôr abaixo metade dos quase 600 coqueiros plantados


Sem a água, que antes corria à vontade das calhas, proveniente de três açudes, o agricultor teve que pôr a mão no bolso e apostar noutra fonte de irrigação. O poço artesiano, que está sendo cavado no seu lote, consumiu R$ 25 mil, e agora representa a única esperança para quem decidiu apostar em outras culturas, como milho, feijão e mandioca, para se manter em atividade. Graças apenas à água dos poços, que é abundante no subsolo, o Perímetro continua em funcionamento, mas os irrigantes têm se endividado cada vez mais. Para não perder seus lotes por completo, cada morador teve que fazer novas dívidas bancárias.
Inadimplência
A situação do agricultor não é exceção dentro do Curu-Paraipaba, onde a inadimplência virou regra entre os 1.070 pequenos produtores rurais, distribuídos nos 805 lotes, com área média de 4,0 hectares por irrigante. Antes recebiam água por aspersão convencional do sistema de calhas, e agora utilizam em 90% da área a irrigação vinda dos poços. A técnica também foi implantada com recursos dos próprios moradores e, em sua maioria, sem nenhum acompanhamento técnico, afirma relatório elaborado pela Associação do Distrito de Irrigação Curu-Paraipaba (Adicp), responsável pela gestão do Perímetro, por meio de contrato celebrado em 2012 com o Dnocs.


A situação é crítica. Fora os empréstimos contraídos com os bancos e não pagos, a Associação não tem recebido, desde 2014, a taxa de adesão mensal, de R$ 70, necessária à manutenção da estrutura. O débito chega a R$ 1.800.000. "A crise hídrica gerou essas e outras inadimplências; mas como arcar com suas dívidas, sem ter uma produção que seja suficiente para a subsistência?", indaga a presidente da Associação, Socorro Barbosa. Cada um dos 300 poços artesianos cavados dentro do Curu-Paraipaba foi arcado pelos próprios agricultores. A situação vai além de preocupante, pois, desde o ano passado, o Dnocs não repassa a parcela de R$ 49 mil mensais relativa à manutenção básica", reclama.
Potencialidades
A cultura predominante do Perímetro, que não teve baixa no número de moradores, apesar das dificuldades, é o coco verde (90%), seguido da graviola (5%) e acerola (5%), que ainda garantem, segundo o levantamento da Associação, emprego e renda para 3.000 pessoas diretamente no campo. Além de possuir uma das maiores áreas de fruticultura irrigada ainda em funcionamento do Ceará, representa 70% da renda proveniente do município de Paraipaba, o que fortalece a rede de pequenos comércios varejistas. O coco produzido em Paraipaba também abastece os Estados da Bahia, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.
A localização, a 46Km do Porto do Pecém, é outra vantagem apontada pelo documento, que cita o potencial crescimento de 200% do coco, na mesma área plantada, como possível desafio, frente às necessidades urgentes: retorno de assistência técnica, regularização fundiária, acesso a novo crédito para investimento, alternativa de abastecimento hídrico para a irrigação, aquisição de máquinas e implementos agrícolas, apoio à comercialização, por meio de associação ou cooperativa e modernização de motores e bombas, que respondem pelo sistema de irrigação.
Plano de Ação
Em 2014, segundo a presidente da Adicp, o Ministério da Agricultura liberou R$ 1 mi para a escavação emergencial de 35 poços, via Dnocs, um para cada quatro irrigantes, mas a obra não atendeu nem menos da metade da demanda. "Nós ainda aguardamos a construção do restante dos poços", diz a presidente. Tendo sobrevivido ao ano de 2016 sem os repasses, o Perímetro segue à espera da execução do novo Plano de Ação, assinado em novembro do ano passado pelo Dnocs, para o exercício 2017-2021, orçado em R$ 590 mil anuais para incremento estrutural e de atividades. A primeira parcela é aguardada para fevereiro.
Forquilha
Implantado em 1974, pelo Dnocs, a 16Km de Sobral, no Norte do Ceará, o Perímetro Irrigado de Forquilha tinha como beneficiárias 73 famílias distribuídas em 141 hectares, que tiravam seu sustento da produção de coco, milho e capim para o gado. Nos idos de 1977, culturas como banana, feijão e algodão também passaram a fazer parte do cotidiano daquela comunidade agrícola, instalada em três setores do Perímetro.
A possibilidade de ter um lugar para criar os filhos, garantindo a permanência da família no campo, atraiu Francisco Rodrigues Vasconcelos, hoje presidente da Cooperativa dos Irrigantes de Forquilha (Coif), e que em 1999 iniciou o plantio de milho e feijão. No local, a pecuária de leite e corte também tem sua importância, com cerca de 600 animais, segundo levantamento da Cooperativa. O irrigante lembra o período em que viu a água correr pelas calhas pela última vez. "Estamos com cinco anos de seca. Zerou água, zerou tudo. Continuamos plantando milho e feijão como sempre plantamos, com o inverno fraco, mas sempre com perda de sementes de 70 a 80%", lamenta.
O presidente da Coif diz que o Dnocs solicitou, em 2015, um levantamento sobre a situação do Perímetro, mas até agora nenhuma alternativa foi apresentada e os custos para a manutenção das atividades têm sido mantidos pelas famílias que não abandonaram seus lotes.
O Açude Forquilha, que abastecia o Perímetro, segue com apenas 0,91% de sua capacidade. A saída, por enquanto, foi cavar cacimbas, principalmente para garantir a água diária dos animais, mas nem sempre isso é possível. "O que tem mantido mesmo as famílias em seus lotes é um benefício ou outro do governo federal, o funcionalismo público ou o emprego de operário nas fábricas da região", conta Francisco. Sem produção, a inadimplência tem se estendido, ao longo dos últimos anos, por meio de empréstimos contraídos com bancos e sucessivas renegociações. Francisco, por exemplo, deve R$ 80 mil dos últimos empréstimos feitos por meio do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).

Diário do Nordeste

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